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Entrevista com Pedro Aguiar
11/09/2022 , por Beatriz Franco
Se você já viu alguém dando um varial na Praia Grande, pode saber que esse cara é o Pedro. Surfista casca grossa e roqueiro, ele conhece tudo sobre a cena do surf brasileiro. De atleta profissional a professor apaixonado por ensinar, o Pedro é um dos principais nomes do surf de Ubatuba. Quer saber mais dessa história? Veja a nossa entrevista com ele.
Eu sou Pedro Aguiar
O início
Eu comecei a surfar por influência do meu pai, que também é surfista. Eu tinha uns 4 anos e a gente morava em São Sebastião. Minhas primeiras ondas foram na Praia da Baleia. É uma onda que parece muito com a onda da Praia Grande. Sempre que meu pai ia surfar, no final da queda ele me colocava em algumas ondinhas na beira, e aí eu fui pegando o gosto e desde então não parei mais. Foi amor à primeira vista, ou aos primeiros drops rs.
Meu pai também teve uma escolinha, a primeira escolinha de surf na Praia da Baleia, junto com o Wagner Pupo. Eu cresci com a família Pupo, éramos vizinhos, estávamos sempre juntos brincando, surfando e andando de skate. Somos próximos até hoje e eles tiveram um papel muito importante na minha trajetória. Eu sou da idade do Miguel, mesma geração, então a gente partilhava da mesma vibe, de treinar, de querer evoluir. Foi ali, na escolinha da Baleia, que começamos nossos primeiros passos em treinos mais voltados pra competição. A gente passava o dia na praia treinando, e meu pai sempre me apoiou e me incentivou, então esse cenário todo fez com que eu evoluísse muito rápido.
Competições
Eu lembro da minha primeira competição, eu tinha dez anos. Hoje em dia a criançada começa bem mais cedo.
Na época, a minha geração foi a primeira que teve a categoria petit, que é a sub-10. Antigamente era a partir do sub-12. O primeiro evento sub-10 que fizeram foi aqui na Praia Grande, um circuito municipal mesmo, Ubatuba Pro Surf.
Cena do surf profissional
O surf no Brasil passou por um período de transição, de vários e vários anos sem eventos. Isso foi muito ruim. O Brasil é conhecido por ser um dos maiores expoentes no surf mundial, uma geração até dos nossos amigos, o próprio Filipinho Toledo, Medina, Ítalo, os Pupos, pessoas que hoje trazem tantas alegrias pro surf do Brasil. Esses caras tiveram uma carreira já mais bem sucedida no circuito mundial, mas o circuito brasileiro perdeu muito espaço.
Anos atrás, eu lembro que quando eu era criança, o circuito brasileiro era muito forte. A gente cresceu assistindo os melhores do Brasil no Super Surf. Os atletas tinham a condição de fazer uma carreira nacional, e com o investimento que eles tinham, com a grana dos eventos que eles participavam, tinham a possibilidade de investir em uma carreira internacional.
Depois que o circuito nacional morreu, complicou tudo. Foram muitos e muitos anos sem campeonatos grandes. Então, ou o cara tinha uma condição e oportunidade de correr o circuito mundial ou ele não tinha mais o trabalho dele. Isso atrapalhou muito a evolução da galera. Hoje a gente vê muitos atletas despontando lá fora, mas eu acho que esse número poderia ser ainda maior pela quantidade de talentos que a gente tem no Brasil.
Esse ano vimos a nova confederação brasileira retomar os eventos com boas premiações. Acredito que daqui pra frente a engrenagem vai voltar a funcionar. Muitos que estavam parados viram a oportunidade de retomar e voltar a viver do surf, uma galera super talentosa que já estava meio sem perspectiva de continuar no esporte. A tendência é fortalecer o circuito nacional, com patrocinadores investindo novamente e abrindo as portas do cenário internacional para novos talentos.
Surf nas Olimpíadas
Com certeza a entrada do surf nas Olimpíadas fez diferença, popularizou o esporte. Hoje a gente tem muito mais adeptos, mais pessoas interessadas em aprender, em conhecer mais sobre o esporte, ou mesmo o pessoal que gosta só de assistir. A visibilidade foi muito grande e eu acho que, pra gente que trabalha com isso, foi muito importante, porque movimenta tudo. O resultado é mais visibilidade, mais oportunidade de patrocínios investirem, de marcas fora do segmento do surf estarem olhando, incentivando, apoiando o esporte, e fomentando novos talentos.
Cena do surf em Ubatuba
Ubatuba é conhecida como a capital do surf aqui no Brasil, não só pelo número de talentos que nós temos aqui, mas também pela qualidade de onda. A gente é privilegiado! Temos todo tipo de onda, onda cavada, onda gorda, toda praia recebe algum tipo de ondulação. O fator qualidade de onda, faz com que os atletas evoluam rápido.
Além disso, nós também temos o trabalho da escolinha no Perequê e na Praia Grande, apoiado pela prefeitura. Muitos talentos saíram daqui. Hoje eles focam nos iniciantes, mas na minha geração existia um trabalho voltado para competições com os professores Fabinho e Jacó. Isso ajudou muito a minha geração, o Tchuca, o Filipinho…
Ubatuba tem um grande potencial. A prefeitura apoia, faz o circuito municipal que é considerado o maior do país, tanto pelo nível técnico, quanto pelo número de categorias. O circuito abrange desde o sub-10, até o pessoal do longboard kahuna de 50 anos. Mas acho que com mais investimentos, tanto da iniciativa privada quanto da prefeitura, poderíamos ter mais eventos com foco na base, que é o futuro.
Promessas do surf
Eu vou puxar um pouco a sardinha pro meu lado. Meu irmão, o Diego Aguiar, tem se destacado muito nas competições, ele é uma grande promessa, já compete há muitos anos e já ganhou inúmeros títulos. Ele tem cinco títulos paulistas, já foi campeão de etapas do brasileiro. Agora ele está se adaptando ao primeiro ano como profissional, tem se dedicado bastante e tem um futuro brilhante pela frente.
Sobre a geração ainda mais nova, eu vejo um potencial gigantesco aqui em Ubatuba. Eu diria que a gente tem a melhor geração sub-12 do Brasil. Temos atletas muito jovens, mas com uma bagagem enorme. A Marina Suguimoto, que eu acompanho de perto, é uma menina super dedicada e se joga em qualquer tipo de mar. O Kalani Robles é um menino muito promissor, já tem inúmeros títulos apesar da pouca idade, super competitivo e talentoso. O Eduardo Mulford, da mesma geração, já domina as manobras aéreas e progressivas. O Kailani Rennó, filho do Zecão lá de Itamambuca, é um garoto que se joga nas ondas grandes, tem uma técnica pra tubo diferenciada. Todos eles estão puxando o nível e se ajudando a evoluir, e com certeza vão trazer bastante alegria pro Brasil num futuro próximo.
Fim da carreira profissional
É muito desgastante. Eu comecei a competir bem cedo, participei de muitos eventos, e fiz uma carreira madura com bastante resultado. Eu tenho mais de cem troféus em casa. Minha geração foi uma geração muito difícil, a galera era muito boa mesmo.
Eu competi com a geração do Miguel (Pupo), Alejo (Muniz), Caio Ibelli, Jessé (Mendes), o próprio Tchuca, o Alanzinho, uma galera que não tinha bateria fácil. O nível era muito alto, cada bateria parecia uma final. Chegar nas quartas ou na semi do circuito paulista já era um resultado irado.
Fui atleta da Hurley de 2006 a 2012. Eu e meu irmão, o Artur Aguiar, fomos os primeiros atletas no Brasil. Mas na transição do amador pro profissional, a gente perdeu esse patrocínio. O surf é um esporte caro, tem a logística das viagens, as passagens, as inscrições. Eu já estava um pouco desanimado com relação a resultados e polêmicas de julgamento… É um ambiente bastante estressante. Então, comecei a focar no free surf, aí depois entrei na faculdade de educação física, já pensando em trabalhar com as aulas.
Mas eu to sempre de olho nos campeonatos. Eu acompanho meu irmão que tá participando de vários eventos e quer isso pra carreira dele. A gente super incentiva, mas sabe das dificuldades, por ter vivenciado. Passei por muita coisa, então eu sei o quão difícil é e o quão importante é o atleta ter investimento, ter um suporte por trás, porque não é só ele entrar na bateria e ganhar o campeonato, tem muita coisa por trás que é fundamental pra que o cara chegue lá e represente da melhor maneira.
Ser professor
Na época que meu pai teve a escolinha em São Sebastião, a temporada lotava e eu dava umas aulas pra ajudar. Eu gosto da ideia de passar o meu conhecimento adiante.
Quando eu terminei a faculdade, recebi o convite pra trabalhar na escolinha da prefeitura municipal daqui de Ubatuba, por meio do professor Fabinho, e trabalhei durante dois anos com eles. Foi muito enriquecedor, uma oportunidade pela qual eu sou muito grato. Conheci muita gente e pude aplicar o meu conhecimento com a criançada. Atendi crianças dos bairros mais carentes em um projeto que chamava Surf nas Escolas. Foi uma parada que me abriu muito a mente.
Depois eu saí da escolinha, e muitos pais vieram me procurar porque não queriam que eu saísse. Muita gente gostava do meu trabalho, acompanhava e queria que eu desse continuidade e foi aí que eu comecei com o trabalho mais voltado pro particular. Hoje eu tenho vários grupos grandes, alunos fixos, alunos que vêm com certa frequência de outras cidades, trabalho com intercâmbio com outras escolinhas de outras cidades também. E eu tenho uma loja de surf, a Freedom. Então hoje eu tenho uma rotina que é 100% surf. Eu brinco que eu não sou mais um surfista profissional, mas eu sou um profissional do surf.
Eu trabalho com o que eu gosto e sinto hoje mais prazer do que na época que eu competia porque eu consigo ver o sorriso da galera quando eu to ensinando. O pessoal curte a maior vibe quando sente que tá evoluindo. Eu acho que isso não tem preço, então eu sinto que eu to no caminho certo.
Referências
Eu sempre fui um cara que gostou muito do surf mais underground. Sempre me espelhei muito na galera dos filmes de surf, até mais do que o próprio cenário de competição, pela maneira de surfar, de eu gostar de manobras mais aéreas e mais provenientes do skate.
Minhas referências na gringa são o Chippa Wilson - é simplesmente absurdo o que ele faz, um cara muito técnico. Também me inspiro no Albee Layer. No Brasil tem o Ícaro Rodrigues que é um brotherzasso meu, e me inspira bastante. E tem uma galera geração acima que é mais do surf skate mesmo, o Wellington Gringo, o Rodrigo Generik.
Do cenário competição, não tem como não falar, é o Filipinho. Po o cara é um fenômeno do surf. A gente viu ele crescer, sabe de toda a batalha dele, o tanto que ele se dedicou. O talento dele sempre foi fora da curva. O Medina também, é um surfista completo e competidor nato, aquele cara que pode precisar de uma nota 10 numa regressiva e se vier a onda ele pode fazer. São caras que não tem como não citar. O Mick Fanning é inspiração pela dedicação, o cara trabalhou muito pra conquistar o que ele conquistou.
Onda e praia favorita
Eu gosto de ondas mais extensas, não sou muito fã da ondas cavadas, fechadeira. Eu já rodei muito no Brasil, mas Ubatuba é especial. Eu acho que igual Ubatuba não tem. Acho que a Praia Grande é dona da onda mais high performance que a gente tem. A Vermelha do Centro e o Félix também são duas praias que eu sempre gostei muito, mas a Vermelhinha é o pico que tem o meu coração.
Fora do Brasil eu acho que o melhor lugar que eu já surfei foi na Costa Rica. Já surfei também boas ondas no Peru e Chile. Chile é muito gelado, usei roupa 4.3mm, botinha, parecia um robô, vi as ondas mais perfeitas da minha vida - a galera brinca que é a Indonésia de água gelada -, mas não curti tanto pelo fato de ser muito frio, então é um lugar que eu não tenho muita vontade de voltar.
Mais informações
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